11 de outubro de 2013

[Artigo] A cultura do vinil e o prazer auditivo


Há pouco tempo atrás resolvi investir em um tocador de discos de vinil. Alguns perguntaram-me qual seria a vantagem em voltar a ouvir música neste formato que supostamente seria ultrapassado? Há diversas razões e que vão muito mais além de uma nostalgia ou tentativa de volta ao passado. 

A primeira vantagem, e que muitos alegam, é poder ouvir discos que você tinha guardado em algum armário e que estavam somente "juntando pó". Muitos deles até raros ou difíceis de se encontrar em formato digital. Com certeza essa é uma boa razão. 

Sobre a qualidade sonora, para quem não está familiarizado com o universo audiófilo, há vantagens e desvantagens. O som digital é mais limpo e com poucas imperfeições. Porém no vinil o som parece se expandir, preencher o ambiente. Tem mais profundidade, os graves se sobressaem melhor. É uma experiência sensorial diferenciada.

Mais do que ressaltar as qualidades técnicas, a experiência de ouvir vinil envolve um aspecto emocional que é fascinante. Ouvir discos de outras épocas com os estalidos característicos, o chiado no fim das faixas, é algo fantástico. Você sente-se como estivesse revivendo aquela época. Há nessa experiência subjetiva muito de uma memória afetiva. 

Mas o aspecto principal dessa experiência que eu gostaria de ressaltar é o conjunto do vinil como um todo, o que eu posso chamar de "cultura do vinil". É algo que perdemos nos tempos modernos com a massificação da música provocada pelo formato digital. Hoje temos a disposição infinitas músicas a disposição, basta "baixar" na internet. Isso tem um lado muito positivo que é a possibilidade de conhecer bandas e estilos musicais diversos que anteriormente seria impossível e dispendioso. Só que por outro lado tornamos a experiência de se ouvir música como algo banal e corriqueiro. Ligo meu player no computador no aleatório e disponho de mais de 8 mil músicas. Passo de uma faixa a outra sem me dar conta do que estou ouvindo. Não me interesso mais em saber a história por detrás daquele álbum ou conhecer o artista mais profundamente. Para falar a verdade, eu devo ter pelo menos umas duas mil músicas que baixei e nunca consegui ouvir. Neste caso você não "tem" fisicamente a música. Tudo é virtual.

Com o vinil você vai atrás dos discos. Garimpa-os em sebos e sites especializados. Cada aquisição é comemorada, você obtém o disco fisicamente. Pega-se o álbum, vê-se o encarte e deve seguir um ritual antes da audição. No meu caso, abre-se uma boa cerveja (de preferência uma que eu produzi com meus companheiros cervejeiros -  e cerveja artesanal é outra experiência que vale a pena relatar em outro post), tira-se o disco da capa, o plástico que envolve, se coloca na vitrola, seleciona-se a faixa e a partir dai é viajar nas ondas sonoras...

O fato de você fazer um esforço enorme para achar aquele disco que você tanto curte faz com que você valorize realmente a música que se está "consumindo". É um retorno a uma etapa que se perdeu com o avanço do capitalismo e do consumo de massa. Nos tempos atuais tudo tende a banalizar, a perder as características complexas e profundas. E a "cultura mp3" está fazendo isso com nós. Consumimos música da mesma forma como consumimos junk food: um alimento barato, com uma aparência muito boa, mas pobre em nutrientes. 

Ouvir vinil é como cozinhar em casa. Selecionar os ingredientes, "botar a mão na massa" e ter uma experiência única e subjetiva. É esta experiência que estou atrás novamente, de ter uma relação mais profunda de duradoura com minhas músicas e artistas preferidos. E há ainda a questão da troca, de fazer amizades com quem cultua o mesmo hábito e trocar discos. Trata-se de um hobby que é extremamente prazeroso e gratificante. Uma volta ao passado que é necessária, a fim de manter a experiência auditiva como algo que faz realmente parte de nossas vidas, e não como mais um ato corriqueiro cotidiano qualquer. 

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