7 de agosto de 2008

Drugstore Bukowsky Recomenda [Cinema]: "O Escafandro e a Borboleta" (2007)

Como seria viver totalmente enclausurado dentro de si, tendo como único contato com o mundo exterior somente um dos olhos?

Esta é a singular história que é belíssimamente contada neste filme baseado no livro de memórias (de mesmo título) do francês Jean-Dominique Bauby.

Sempre imaginamos que temos toda uma vida pela frente, que existem inúmeras oportunidades de escolhas e caminhos possíveis. E sempre tendemos a aproveitar um mínimo possível. Pode parecer clichê. E realmente é, pois há muitos filmes que exploram este fato da vida humana: a de que exploramos muito pouco nossa capacidade de viver de diferentes formas e que acabamos por nos conformar com a vida assim como se apresenta da maneira mais fácil a nós. Seja através de livros de auto-ajuda ou do recente sucesso da internet da "Aula Magna" do professor que irá morrer de câncer, este é um tema batido mas que parece aquele tipo de assunto que precisa ser constantemente relembrado para as pessoas pensarem novamente: "como eu não vivo a minha vida plenamente!".

Agora que denunciei o clichê, vamos ao que interessa. Este filme (sobre o livro não posso falar nada) consegue contornar muito bem o clichê e trazer uma visão diferente do assunto. Isso se dá através de uma fotografia e edição perfeitas e uma linguagem poética que fascina desde o início. Os franceses sabem como ninguém lidar com uma história dessa sem cair no pedantismo ou na glorificação da desgraça alheia e exploração sentimental (que o cinema americano tanto abusa). Aliás quase tudo que envolve uma história triste vira manipulação de emoções no cinema atual. Já aqui isto é evitado através do que citei: da forma como a narrativa é conduzida pelo protagonista, de uma maneira extremamente realista, o que parece passar o ponto de vista de quem realmente passou por aquilo, e pelas qualidades técnicas do filme (fotografia lindissima; a trilha sonora complementa muito bem as imagens sem tentar "induzir" emoções; atuações magníficas dos atores).

O filme já começa com um "mergulho" na alma do protagonista e digo que esta experiência chega a ser sufocante. Isto se dá através da utilização da visão do protagonista através das câmeras, demonstrando ao espectador como seria enxergar o mundo como ele. Isto é genial. Não é nada fácil se passar pelo outro e tentar viver sua experiência subjetiva como se fosse a tua realidade. Só por este feito o filme vale a pena, isso para quem está disposto a fugir da tendência atual a se evitar todo e qualquer sofrimento. Este filme é só para aqueles que toparem a encomôda viagem ao mundo estagnante do personagem.

Altamente reflexivo e poético, a história nos conduz a um dilema que dificilmente conseguiriámos imaginar e uma posição igualmente complicada de se colocar: como é viver sem movimento algum? Como seria depender totalmente de outras pessoas para fazer as tarefas mais básicas? E pior, ver a vida (dos outros, diga-se de passagem) passar como um filme infinito, visto com o mínimo de ângulo possível? Utilizando-se de uma metáfora pobre, seria como se olhassemos pela fechadura de uma porta a vida acontecer. Só que isso seria assim até o fim.



Ficha Técnica


Título: "O Escafandro e a Borboleta"(Le Scaphandre et le Papillon, França/EUA, 2007).
Gênero: Drama Duração: 112 minutos
Direção: Julian Schnabel
Roteiro: Ronald Harwood, baseado em livro de Jean-Dominique Bauby
Produção: Kathleen Kennedy e Jon Kilik
Elenco: Mathieu Amalric (Jean-Dominique Bauby), Emmanuelle Seigner (Céline Desmoulins), Marie-Josée Croze (Henriette Durand), Anne Consigny (Claude), Patrick Chesnais (Dr. Lepage), Niels Arestrup (Roussin), Olatz Lopez Garmendia (Marie Lopez), Jean-Pierre Cassel (Lucien / Vendeur Lourdes), Marina Hands (Joséphine), Max von Sydow(Papinou), Isaach De Bankolé (Laurent), Emma de Caunes (Imperatriz Eugénie), Jean-Philippe Écoffrey (Dr. Mercier), Nicolas Le Riche (Nijinski), Lenny Kravitz (Lenny Kravitz), Michael Wincott (Michael Wincott). Para quem gosta de: filmes introspectivos, dramas pessoais. Pontos Altos: fotografia; roteiro; narrativa em primeira pessoa; atuações dos atores. Pontos Baixos: não encontrei algum. Avaliação: 9,0


Trailer: