25 de março de 2009

Radiohead São Paulo 22 de Março de 2009

Esperei dois dias para tentar descrever um pouco do que foi o espetáculo que presenciei na Chácara do Joquei em São Paulo, no dia 22 de março de 2009. Até agora tenho a impressão de que aquela experiência não  acabou ainda (e não deve terminar tão logo!). Eu poderia escrever uma resenha com o intuito de ser mais objetivo o possivel (o que jornalistas tentam fazer o tempo todo) - mas como fã só posso contar minha experiência, assim como relacioná-la com uma parte de minha vida, o que deixaria mais clara a razão da importância deste show. 

Não gosto destas discussões acerca do Radiohead ser a "melhor banda do mundo", ou de sua importância para a música mundial. Radiohead é para mim "a banda" por que é a trilha sonora que me acompanha desde 1997 (pelo que me lembro). E ver este show significava finalmente o encontro com os "criadores" de boa parte dos sons que embalaram diversos fatos de minha vida, e ouvir algumas destas músicas foi simplesmente uma viagem no tempo.

Aos primeiros acordes de Karma Police, a sexta  música executada, as lágrimas surgiram ao  mesmo tempo que memórias do fim de minha adolescência passavam em flashes na minha cabeça. Todas as angústias, todas as incertezas de uma nova fase da vida que estava por começar, desilusões, perdas e até alegrias - era isso que esta música representava para mim. 

O  próprio álbum Ok Computer!  foi a trilha sonora dominante neste período e coincidiu com muitas coisas que aconteciam em minha vida. O início da faculdade de Psicologia - uma tentativa desesperada de sair de si mesmo e de explorar outros mundos- foi acompanhada de diversas frustrações e disilusões. Nesta época entrei em contato com um livro que mudou toda minha visão de mundo: O mal-estar na civilização, de Freud, uma "pá de cal" em todo e qualquer ilusão de felicidade, o que de certa forma trata o Ok Computer - um mundo onde o homem não tem mais o domínio de si e está fadado a ser refém daquilo que ele mesmo criou. Era um tempo de um pessimismo voraz, que só a análise me tirou depois.

Este álbum, ao contrário do que muitos pensam, por ser altamente introspectivo e profundo, para mim não siginificava a "trilha sonora da fossa", pelo contrário, justamente por sua  complexidade e densidade emotiva, possibilitou-me sair de um enclausuramento sufocante e buscar outras saídas para o momento. Neste sentido, as músicas do Ok Computer executadas no show me levaram diretamente para esta época e foi dificil conter a emoção ao ouvir a música que considero a mais triste e angustiante do grupo inglês: Exit Music (for a film). A beleza com que foi interpretada por Thom Yorke, com aquele violão cadenciado que vai crescendo aos poucos, e o silêncio repentino da platéia após tentarem acompanhá-la com palmas causou arrepios. Fiquei hipnotizado, parado, acompanhando a explosão de cores que vinha do palco. 

[Texto retomado em 15/04/2009]

Para minha felicidade eles tocaram várias do Ok Computer. Climbing Up the Walls é assustadora  ao vivo. Lucky era tudo o que eu esperava, uma das faixas preferidas do disco. Paranoid Android nem precisa comentar que foi um dos pontos altos do show. Uma das músicas mais esperadas por todos, é simplesmente fantástica ao vivo. Mesmo não tendo tocado as minhas preferidas deste disco - No Surprises e Let Down - não havia como achar ruim. Só tive que lamentar de não ter ido no show do Rio também, pois lá tocaram No Surprises e How to Disappear Completely - esta, a música que eu mais esperava. Porém eu entendo. Com o setlist que rolou, mais estas que citei seria overdose. E Thom Yorke sairia de lá de maca, pois seu esforço e competência surpreendem. Era visivel a forma como o vocalista se entrega no palco. Ali o rapaz weird and creep se transforma em arte bruta.

Outras tantas músicas desta banda me marcaram muito. Em Piramid Song eu fiquei estagnado. Não acreditava que estava tocando. Eu havia ficado o dia todo de espera com esta música na cabeça. Videotape foi sublime, como eu imaginava. A esta hora as lágrimas já estavam secas no rosto, o que não duraria muito até que os primeiros acordes no violão de Fake Plastic Trees se iniciaram. Ai caiu a ficha. Ali, praticamente próximo do fim do show, eu saquei o que estava acontecendo. Era minha vida em flashes, eram aquelas cores "espirrando", caindo, ofuscando minha visão, o som puro e cristalino que vinha do palco, músicos totalmente dedicados e afinados, totalmente sintonizados. Era tudo ao mesmo tempo. Não sabia se cantava ou chorava (provavelmente os dois ao mesmo tempo). Depois disso eu já podia ir embora. Porém ainda havia Creep, num impensável 3º bis, um presente aos fãs mais antigos (e aquelas pessoas que só conheciam esta). Ali tudo se resumiu e terminou num tom apoteótico. Eu já não sentia mais nada. Cansado, quebrado, com fome e sede. E com um sorriso de criança que acabou de ver seus super-heróis, porém, na realidade.

Sai deste show com várias certezas. As músicas do In Rainbows, ainda muito "cruas" para mim (normal, demoro cerca de dois anos para absorver cada álbum do Radiohead) se tornaram totalmente palpáveis. Depois do show consegui compreender quase que totalmente sua sonoridade - me impressionei com Nude ao vivo, assim como Reckoner. A segunda certeza, a de que Ok Computer é o maior trabalho deles e será quase impossível superá-lo em genialidade. A terceira e última, que vi o melhor show de toda a minha vida, ao não ser que eles façam outro show melhor que esse, porém nenhuma outra banda conseguirá ter o efeito que teve sobre mim, justamente por ser a banda que mais admiro e que não me decepcionou em nada, pelo contrário, só me surpreendeu. 

1 de março de 2009

Drugstore Bukowski Recomenda [Cinema]: "Paixão Suicida" (2006)

Quem busca o suicídio, aparentemente procura acabar com a dor e todo o sofrimento que implica o existir. Assim rompendo com a própria vida o suicída estaria procurando um estado melhor, ou buscando coisa alguma, apenas um alívio. Esta parecia ser a intenção do protagonista do filme "Paixão Suicida" (no título original, "Wristcutters", literalmente, 
"cortadores de pulsos") quando decide morrer. Porém quando Zia (Patrick Fugit) chega ao além, ou melhor, ao mundo dos suicidas, muita coisa parece não ter mudado. Arranja um trampo fodido, vai morar com um Austríaco chato, existe a polícia, uma tal organização que se assemelha ao Estado. Tudo muito parecido, porém pior. Todos que lá vivem são suicidas. Portanto não sorriem, tudo é praticamente cinzento e sem graça.

Estamos diante de um suposto "universo dos suicidas", composto por "loosers" e desajustados, pessoas que tiveram uma vida ordinária e que decidiram abrir mão dela para se sentirem melhores, porém a fuga do mundo real é fadada a um fracasso maior ainda. Ai está toda a graça deste belo indie movie americano. Como exemplar do cinema alternativo americano, o destaque está num enrendo original e bem construído, mantido por boas atuações. Referencias pop não faltam, a começar pela ótima participação de Tom Waits no filme. Pelo que eu já falei já valeria a pena ver o filme, porém o desenrolar é muito legal. 

Em determinado momento Zia descobre que sua (ex?) namorada também se suicidou e portanto deve estar por lá também. Sabendo disto resolve ir atrás dela. Junto de seu amigo russo Eugene (Shea Whigham, muito bem caracterizado) partem para uma viagem praticamente sem rumo, pois eles não tem idéia de onde ela possa estar. A partir dai se inicia um road movie diferente. No caminho conhecem Mikal (a lindíssima Shannyn Sossamon), uma garota que diz estar ali por engano, e que pretende encontrar uma suposta organização que teria o controle sobre tudo.

O que é realmente interessante - além deste enredo curiosíssimo - é a reflexão acerca de um tema pouco explorado, o suicídio, e ainda de maneira descontraída e satírica. Levando um pouco mais adiante, a abordagem por um tema que me agrada muito - a vida daqueles que não se "encaixam" ao status quo, ao stabilishment, enfim, ao modo gauchè de ser. De certa forma todos os personagens ali en
contram a situação única de estar entre iguais. Quando viviam eram todos de certo modo marginais: drogados, deprimidos, pessoas que não suportavam se enquadrar em algum modo de vida aceitável e "normal". Só que ao morrerem, o suposto alívio e a busca por outra condição são frustrados. Portanto a angústia exestencial não se extinguiu, pelo contrário, se acentuou. O tema do suicídio com certeza não é novo, mas esta abordagem sim. 

Para aqueles que são abertos à novas visões e, de preferência, a uma outra visão que não aquela homoneigizante, romântica e idealizada sobre a vida que o cinema costuma trazer, onde a velha ideologia do american life, do "seja feliz" predomina, é um puta filme. Nem tanto pelas qualidades cinematográficas, mas pela abordagem ousada e criativa.

Ficha Técnica:

Título: "Paixão Suicida" (Wristcutters: A Love Story, EUA/Inglaterra, 2006)
Gênero: Drama/Comédia/Humor Negro?
Direção: Goran Dukic
Roteiro: Goran Dukic, baseado no conto "Kneller's Happy Campers", de Etgar Keret
Elenco: Patrick Fugit (Zia), Shannyn Sossamon (Mikal), Shea Whigham (Eugene), Tom Waits (Kneller), Will Arnett (Messiah), Leslie Bibb (Desiree)
Para quem gosta de: cinema alternativo
Pontos Altos: roteiro, atuações, trilha sonora, fotografia.
Pontos Baixos: nenhum
Avaliação: 9,5

Trailer: