16 de março de 2018

Série Músicas de uma Vida: "Welcome Home (Sanitarium)" - Metallica

Metallica e Freud me levaram à Psicologia. O ano era provavelmente 1996. Um jovem desajustado à
procura de uma identidade, um rumo, algo em se apoiar. O Metallica surge como uma bomba em meus ouvidos, e ali, pela primeira vez, eu encontrava algum sentido para o caos adolescente.

A fúria das guitarras, o peso da bateria, e principalmente, a figura de James Hetfield. Vocais raivosos e densos ao meio da loucura organizada que é o Heavy Metal. As roupas escuras, cabelos compridos e bagunçados. Além de ótimo vocalista, é provavelmente o melhor músico que conciliou a voz com a guitarra base.E o terceiro disco da banda americana, Master of Puppets, foi o grande disco de minha adolescência.

O som pesado e rápido característico da banda passou a conjugar com melodias mais progressivas por assim dizer. É o caso de "Welcome Home", quase uma balada da banda, muito embora no seu desenvolvimento acabe na porrada como todas as músicas da banda até então.

A melodia de Welcome Home já de ínicio me prendeu e logo se tornou minha música preferida da banda. Eu que nunca fui muito ligado em letras, ao conhecer o conteúdo deste clássico, deparei-me com a temática da loucura, dos manicômios e do sofrimento mental. Parece coincidência, mas foi na mesma época que tive os primeiros contatos com a obra de Freud.

Angústia. Dor. Isolamento e subjugamento. O homem em um contexto de restrição e enclausuramento social. Um adolescente que não conseguia relacionar-se. "Sleep my friend and you're see, dream is my reality". O que é realidade? O que é o sonho? Entre a realidade e o devaneio, onde estou?


Bem vindo ao lar (Sanatório)

Bem vindo ao lugar onde o tempo fica parado
Ninguém sai e ninguém sairá
A Lua está cheia, nunca parece mudar
Apenas rotulado como doente mental
Sonho a mesma coisa toda noite
Eu vejo nossa liberdade à minha vista
Sem portas fechadas, sem janelas trancadas
Sem coisas para fazer meu cérebro parecer assustado

Sonho de liberdade para quem está aprisionado e afastado de sua vida real. Minha prisão não era física, mas era psicológica. Enclausurado em si eu via meu mundo ruir. E o som de Metallica conseguiu trazer algum sentido para tudo isso. Ao mesmo tempo a figura de Freud surgia enigmática e apontando para o meu real interesse na vida: a compreensão. Sim eu não quis estudar Psicologia para ajudar as pessoas. Eu fui em busca de um conhecimento e uma razão para todo a irracionalidade que eu experimentava (e ainda não compreendo) no Universo. A lógica positivista, rasa e objetiva, explicava a Ordem, e não o Caos. Ela nunca me satisfez. Havia o Inconsciente, e essa descoberta mudou tudo. Eu e o meu caminho.

Sussurre coisas em meu cérebro
Assegurando-me que eu sou insano
Eles acham que nossas cabeças estão em suas mãos
Mas hábitos violentos geram planos violentos
Mantenha-o amarrado, isto faz bem a ele
Ele está melhorando, você não pode ver?

Nesse época eu vivenciava a descoberta e o choque com a Realidade. Minha geração foi provavelmente a última a experenciar os métodos da educação repressiva. O recalque ainda era o mecanismo predominante. E a adolescência significava para nós o querer romper com as rígidas amarras familiares e ao mesmo tempo o confronto com as estrutura sociais. 

Os bons costumes, a frágil e hipócrita moral burguesa, assim como o fracasso das grandes instituições sociais como a Religião, o Estado e a Ciência, levaram a consolidação de uma geração nomeada como "X", por justamente não se enquadrar em nenhum modelo pré-concebido e por isso mesmo ter como principal característica um espírito anarquista e niilista. Vazio de sentidos e ações, mas carregado de angústia e depressão. 

Nesse contexto Kurt Cobain foi o grande catalisador disso tudo. Mas o Heavy Metal surgiu ao mesmo tempo com uma outra visão, um modo agressivo e barulhento de manifestar todo o ódio e incompreensão de uma geração. O Metal canaliza a violência e encontra um lugar simbólico para ela. Não é a toa que psicopatas não ouvem Black Sabbath, mas sim Beethoven. 

Welcome Home foi a canção que uniu a raiva, a incompreensão e a angústia adolescente com um desabafo contundente sobre o sofrimento humano. E isso me levou diretamente à Psicologia (e de cara à Psicanálise) e o que eu entendo de essencial nesse discurso: a busca por uma interpretação e organização do caos psíquico e social. 

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