8 de outubro de 2014

É hora da mudança!


Quando iniciaram os protestos de junho e julho, a partir do Movimento do Passe Livre, um fato chamou-me a atenção: o apartidarismo declarado dos manifestantes e o repúdio àqueles pertencentes aos partidos de esquerda que tentaram participar do movimento. Era um grupo de maioria classe média e alta, que se diziam indignados com “tudo” o que estava acontecendo por “ai”. Quando questionados sobre os seus propósitos e bandeira de luta, mal conseguiam definir o foco, qualquer coisa era corrupção, roubalheira, de modo geral, uma ode contra os “políticos” que reinam em Brasília. Muitos analistas apontaram que era apenas uma onda e que os únicos que tinham uma causa clara logo caíram fora, no caso o Passe Livre e a “conquista” dos R$ 0,20.


Naquele momento eu já previ que este movimento tinha um outro propósito e serviria logo a interesses mais específicos. A direita, que sempre buscou ocultar suas posições políticas, sempre contou com uma massa de manipulação justamente despolitizada. O pretenso discurso contra a política de modo geral guarda um significado bem delineado: o conservadorismo. Aqueles que dizem odiar a política e condenar qualquer ação desse tipo na verdade gostam de deixar as coisas como estão. Para quem está a um degrau acima na escala social é cômodo permanecer assim, mas incomodam-se muito quando os membros do degrau de baixo ameaçam ocupar o mesmo lugar. É o paradoxo da classe média: vivem a sombra dos membros da elite e tem um pavor de serem alcançados pelos “pobres”.

É o que vem acontecendo há algum tempo no Brasil. Os avanços enormes conquistados com as políticas sociais do ultimo governo incomoda em muito a “velha” classe média e alta. A percepção de que uma grande parcela da população está tendo acesso a bens e serviços que antes eram exclusivos da parcela média e alta, e ainda, por culpa do Governo, é um absurdo para muitos. Ver tantos carros populares zero quilometro nas ruas, dividir poltronas de avião com “essa gente”, e pior, até os cruzeiros marítimos estão tomados pela nova classe “c”, provocou uma onda de indignação.

Benefícios sociais como o Bolsa Família e Auxilio Reclusão são demonizados por aqueles que acreditam “levar o país nas costas” a base de seus impostos e consumo. Esquecem que toda a riqueza do país está nas forças de produção, na mão-de-obra que levanta cedo todos os dias e rega os campos e lavouras, colocam as fábricas em funcionamento e constroem prédios e mais prédios, injetando bilhões na economia. Ignoram o fato que todo dinheiro concedido nos benefícios alimenta o mercado interno e movimenta a economia. Possibilitam o acesso a bens que antes nem seriam vendidos. Alguém acha que celulares venderiam tanto sem o Bolsa Família?

Quando chegaram as eleições foi possível conhecer melhor o que era o “grito por mudanças” de toda essa classe média "sofrida" e ameaçada de perder seu lugar. Uma onda conservadora inundou as Assembleias Legislativas e o Congresso Federal. O Governo do PT mexeu em um vespeiro. Avançou justamente no desenvolvimento social e iniciou o debate sobre uma série de assuntos espinhosos e incômodos para a classe média reacionária: legalização das drogas, aborto, direitos sexuais das minorias e racismo. Quando começaram esses assuntos a surgirem nas pautas logo uma reação conservadora monstruosa despertou das profundezas de nossa pátria. E o que vimos como resultado das eleições foram uma maioria de conservadores eleitos: pastores evangélicos, militares, defensores da família brasileira. Temos agora uma novíssima bancada da “bala” e da “fé” (o que parecia incompatível se une agora de maneira formidável!).

O grito de mudança ficou mais claro. O que eles querem realmente é mudança, mas através do retrocesso. Querem voltar há quarenta anos atrás quando a pequena classe média vivia em paz. Todos os excluídos e renegados da sociedade eram tratados na bala. Não “existia” criminalidade. Os valores cristãos e a tradição estavam garantidos. As velhas oligarquias latifundiárias e os empresários enriqueciam em paz com o apoio dos militares e aceitação passiva de uma população ignorante e miserável. Os comunistas eram uma ameaça, pois comiam criancinhas e eram perversos, devassos e delinquentes. Eram contra a “ordem”.

O povo que quer mudanças tem saudades de uma época que não viveram, mas que ouviram de seus pais e avós que não existiu uma ditadura militar e sim uma época de crescimento e “progresso”. Não compreendem que os conflitos que vivemos hoje são muito mais de classe e de ideologia do que uma pretensa crise econômica devida a politica econômica adotada pelo governo atual.

Quando se questiona a um dos reprodutores do discurso “odeio o PT/fora Dilma” quais o reais motivos de tanto ódio, dificilmente você ouve uma resposta lógica e fundamentada politicamente. São respostas vazias e que reverberam um discurso reacionário da mídia marrom: “sou contra tudo que está ai”, “contra a roubalheira do governo”. Colocam toda a responsabilidade por defasagens históricas e problemas culturais que nos assolam a séculos na figura de uma única mulher: a Presidenta do País. Todos ignoram que o Estado e o Governo são estruturas extremamente complexas. O governo Executivo depende do Legislativo para governar e aprovar os projetos necessários para o país evoluir. Desejam “mudanças” e votam em deputados estaduais e federais mais conservadores possíveis. Entre os mais votados, Marco Feliciano e Jair Bolsonaro. Tiririca. Candidatos realmente comprometidos com mudanças profundas na sociedade: transformar o país em uma nação fundamentalista cristã (com exceção do Tiririca que ainda não descobriu o que um deputado faz, mas vai na onda...).

E no topo desse conservadorismo está a figura do candidato da “oposição” que conseguiu ir ao segundo turno. No primeiro turno quase sumiu com a rápida assunção nas pesquisas de Marina Silva, a candidata mais incoerente e perdida em suas posições políticas e projeto de governo. Logo se viu que sua inconsistência não daria nem para convencer os despolitizados (ou o chamado “voto volúvel”). Ai surge a figura de Aécio, o playboy salvador da pátria, o novo Collor, o cara que está contra tudo o que está ai. Um potencial de mudança. Mas que mudança? Mudança para trás, ora bolas! Todos os conservadores estão com eles. Estão todos lá, os velhos personagens do passado: latifundiários, megaempresários, banqueiros, militares, pastores e fundamentalistas. Os novos também: toda a massa despolitizada e contra-tudo/contra todos. Basta de corrupção!


O PSDB é o próprio modelo da ética e honestidade. Foi contra o mensalão (e também o criou !). Aécio representa a família brasileira em sua essência. Essa fama de pegador de modelos e aspirador é intriga da oposição! Ele sempre esteve do lado do povo (faz campanha para as socialites e seus poodles em São Paulo). Ele é o cara que vai resolver todos os problemas do Brasil e fazer com que voltemos a ser aquela nação honesta e simples de anos atrás, antes desse governo progressista do PT. Vai acabar com a corrupção e esses Bolsa-Esmolas. Vai, enfim, apoiar a classe média e os livrar dos pobres. 

Nenhum comentário:

Postar um comentário

Impressões, opniões, críticas e elogios são bem vindos